Um outro litoral

Tábua das marés também dita o ritmo; todo mundo sabe quando o mar estará mais baixo ou mais alto ao longo do dia

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É preciso atenção e disciplina para se aliar aos caprichos da natureza. Foto: Tatiane de Sousa

Por Tatiane de Sousa, Jornalista

O Oceano Atlântico é o mesmo. A distância é de mais de 2.600 Km entre o litoral sul da Bahia e o litoral norte gaúcho. No entanto, o que afasta os dois destinos turísticos é bem mais do que os quilômetros. Em Porto Seguro e arredores é verão o ano inteiro e talvez por isso, o ritmo seja outro, tudo mais calmo, mais simples. No entanto, engana-se quem parte do senso preconceituoso de que baianos são lentos ou descansados. Trabalham muito, de sol a sol, tendo como quase atividade econômica exclusiva, o serviço de turismo.

É inegável que a beleza natural, o mar calmo, cristalino e com temperatura média de 25 graus, ajuda bastante. A tábua das marés também dita o ritmo: todo mundo sabe quando o mar estará mais baixo ou mais alto ao longo do dia, o que determina o horário dos passeios e acesso às praias, ao mangue, às piscinas naturais. É preciso atenção e disciplina para se aliar aos caprichos da natureza, mas também muita resiliência para compreender que não há como mudar esse ritmo. Mas sem dúvida, o que a Bahia tem de melhor são os baianos, ou a baianidade.

Porto Seguro foi o local onde portugueses aportaram no Brasil pela primeira vez. No vilarejo ainda sem nome, rezaram a primeira missa e fundaram as primeiras capelas, construíram as primeiras casinhas e dividiram o espaço como pequenos bairros entre locais de brancos, pretos e indígenas. Tudo isso ainda pode ser visto nas construções preservadas, na cultura que permanece sem necessidade de muito estudo simplesmente porque uma geração passa para outra. Na miscigenação e aculturação, as crenças se respeitam e se acrescentam. Na cidade, vale a pena mergulhar um pouquinho na história passando pelo Centro Histórico, Passarela da Cultura, Memorial do Descobrimento e na praia da Coroa Vermelha, a cruz que marca o local da primeira celebração religiosa cristã.

Magia mesmo, no entanto fica nas praias do outro lado do Rio Buranhém, acessadas apenas através da balsa que parte de meia em meia hora do cais de Porto Seguro levando veículos, ou pelas lanchas para pessoas. Em 10 minutos já se chega ao outro lado e a pergunta que fica é porque ainda não há uma ponte para essa travessia. E aí começam a se decifrar as delícias das praias de Arraial d’Ajuda, Trancoso e outras não tão famosas, mas igualmente encantadoras, como a Praia do Taípe, Coqueiros e Caraíva.

Mar calmo, cristalino e com temperatura média de 25 graus. Foto: Tatiane de Sousa

Até meados dos anos 70 as praias que ficam depois do rio que margeia Porto Seguro eram destino quase que ignorado por turistas: eram vilarejos de pescadores de difícil acesso. Nesta época porém, hippies vindos de outros lugares do Brasil e mesmo do exterior, aportaram nas praias bucólicas, no estilo de vida em “slow” e descobriram nos vilarejos coloridos perto de falésias de frente para o mar, um estilo de vida sustentável e com muito mais qualidade.

Longe do luxo, do lixo, do barulho e das necessidades criadas pela vida nos grandes centros urbanos, desenvolveram um turismo preocupado com a permanência das belezas naturais e dos negócios, sem esticar demais a corda.

Trocando em miúdos, a falta da ponte e estradas asfaltadas, a proibição de tráfego de veículos nas áreas históricas, a obrigatoriedade de hospedarias seguirem regras como uso de energias limpas e coleta de água da chuva, a preservação das casinhas bem como eram antigamente sem nada de edifícios verticais além de restaurantes que preservam a culinária local, são opção dos moradores que veem a possibilidade de um futuro próspero ou perene somente com uma ação sustentável no presente.

É claro que após os primeiros anos da descoberta do novo “point”, aconteceu a gentrificação: em Trancoso por exemplo, um destino conhecido como um dos mais exclusivos do Brasil, quem chegou com dinheiro no bolso e uma ideia na cabeça comprou uma das lindas casinhas do centro histórico e colocou seu negócio. Os donos atuais não são nativos. A rua hoje, lindíssima, e onde só se chega a pé, é cheia de restaurantes chiques e lojas com peças exclusivas. As pousadas, todas com selo de sustentabilidade, aliam elegância e serviços impecáveis à preservação histórica e ambiental. As duas estradas que separam Trancoso de Arraial D’ajuda são péssimas, assim como a que segue até a Praia do Espelho, um pouco mais adiante.

Novamente erra quem pensa que faltam recursos: a vida é simples, mas não faltam empregos, comida à mesa ou escolas. De acordo com o IBGE o município é o nono no Estado e o primeiro na região com pessoas ocupadas. A taxa de escolarização entre os 06 e 14 anos é de mais de 96%.

Fotos: Tatiane de Sousa

As pessoas trabalham muito, cuidam das suas cidadezinhas como cuidam das suas casas e nas folgas, vão à praia e alimentam sua religiosidade. Pesquisas no mundo inteiro apontam que o segredo da felicidade está baseado no tripe saúde física, mental e espiritual muito além da busca de sucesso e riqueza. E aí está o segredo da baianidade.

Pontos turísticos e alguns preços:

O que ver em Arraial d’Ajuda

  • Largo da Ajuda: próximo a Igreja Matriz com bares, restaurantes, cafés e lojas de artesanato.
  • Rua da Broadway: colorida e cheia de lojinhas e restaurantes.
  • Rua Mucugê: música ao vivo e outras apresentações culturais ao longo da rua que abriga espaços como o Beco das Cores e a Praça Caminho do Mar. A rua leva até o Centro Histórico onde, no final da caminhada, chega-se ao Mirante das Fitinhas do Senhor do Bonfim.

Pousadas Arraial d’Ajuda:

A partir de R$ 500 é possível se hospedar perto da praia, num local com infraestrutura básica que inclui café da manhã e piscina.

Barracas na praia: As barracas são o que chamamos por aqui de quiosques, mas com uma infraestrutura muito melhor com direito a cadeiras, espreguiçadeiras e guarda-sóis. A maioria não cobra consumação mínimo e o ocupante pode ficar no local o dia todo pagando apenas o que consome.

Os preços são salgados, mas no geral compensam já que a sugestão é ficar o dia todo no local. Amanhece cedo e escurece cedo além de a maré ficar baixa até por volta das 9h30 na maioria das vezes. Então a dica é chegar até 9h no máximo e ficar na praia até umas 16h. O cardápio nas barracas inclui bebidas com variedade de sucos e drinks com e sem álcool, petiscos e pratos tradicionais como a moqueca de camarão e outros frutos do mar e peixes. A maioria dos estabelecimentos não se opõe ao consumo de alimentos vendidos pelos ambulantes cadastrados que levam até a praia lanches quentinhos variados.

Preços médios:

  • Moqueca de camarão com acompanhamentos: R$ 150
  • Drinks: R$ 30
  • Sucos: R$ 25
  • Petiscos: R$ 40 a R$ 80
  • Ingresso Memorial do Descobrimento em Porto Seguro: R$ 30 a R$ 50.
  • Passeio de chalana no Rio João de Tiba incluindo banho de lama no mangue e outras três paradas em vilarejos para banho, almoço e compras: R$ 119 (não inclui almoço e consumo do bar).

O que ver em Trancoso:

O vilarejo é muito pequeno, mas também muito bonito. As casinhas coloridas estão no chamado Quadrado de Trancoso programa que deve ser feito tanto de dia como à noite. Além das construções, compõem o visual a arborização bem pensada e a iluminação charmosa. A rua desemboca no mirante da praia. Vale a pena também reservar um tempo e sem pressa ver o pôr do sol na praia. O local abriga vários restaurantes com comida para todos os paladares. Os preços são uma facada, mas pesquisando direitinho dá para apreciar um bom prato sem alterar o orçamento da viagem. O cenário e o clima do local valem o gasto.

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