Tartaruga agoniza na areia após engolir anzóis, cabo de aço e linha de nylon

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Tartaruga foi encontrada agonizando na Barra de Tramandaí. Foto: Litoral na Rede
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Voluntários levaram tartaruga-cabeçuda para o Ceclimar, mas ela não resistiu. Foto: Litoral na Rede

Havia muita gente aproveitando o fim de tarde na Barra do Rio Tramandaí. Na areia, a poucos metros da água, uma grande tartaruga chamava a atenção. Ela quase não se mexia. Algumas pessoas pensaram que estava morta. Mas outras perceberam que o animal movimentava os olhos e a cabeça, aparentemente com dificuldade.

Moradores da Barra, em Tramandaí, foram avisados e se mobilizaram para tentar salvar a tartaruga marinha. A Patrulha Ambiental não tinha efetivo disponível e o Ceclimar já havia encerrado o plantão daquele sábado. Mesmo de folga, a bióloga Cariane Trigo, que trabalha no Centro de Estudos Costeiros Limnológicos e Marinhos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ceclimar), somou-se ao mutirão para resgatar a tartaruga-cabeçuda.

Com todo o cuidado, cinco pessoas levantaram o animal de aproximadamente 100 Kg da areia, sob supervisão e orientação da pesquisadora. Com o banco traseiro de um veículo baixado, foi possível acomodar a tartaruga no porta-malas e levá-la até o Centro de Reabilitação de Animais Marinhos, em Imbé.

Na cloaca da tartaruga, estavam presos pedaços de linha de nylon, indício de que ela poderia ter sido atraída por uma isca de pesca e ter engolido o material. Apesar dos esforços dos voluntários, da bióloga e do médico veterinário do Ceclimar, Derek Blaese, o animal não resistiu e morreu no dia seguinte.

Causa da morte

O resgate ocorreu no dia 15 de dezembro de 2018. Após a morte, a tartaruga foi congelada e, nesta semana, a carcaça foi submetida à necropsia. O resultado confirmou a suspeita: dentro dela havia dois anzóis, um cabo de aço e três metros de fio de nylon.

“Os dois anzóis estavam fixados no início do esôfago, logo no início do pescoço. Um deles tinha cabo de aço e outro tinha fio de nylon, que saia pela cloaca. (O fio) estava passando por todo o trato intestinal”, relatou o médico veterinário Derek Blaese ao Litoral na Rede.

Dois anzóis, um cabo de aço e um fio nylon estavam no trato intestinal da tartaruga marinha.

Espécie ameaçada de extinção

A tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta), assim como as demais espécies de tartarugas marinhas que habitam os mares brasileiros estão ameaçadas de extinção.  A carapaça dos adultos atinge em média 1 m de comprimento. E sua massa corporal média é de cerca de 150 a 180 kg.

No Brasil, a tartaruga-cabeçuda pode ser encontrada ao longo de todo litoral, em áreas de alimentação, especialmente na região costeira do Rio Grande do Sul, ou de desova, principalmente na costa do Espírito Santo, Bahia e Sergipe.

No Litoral Gaúcho é a espécie mais vista, seguida pela tartaruga verde (Chelonia mydas) e da tartaruga de couro ou gigante (Dermochelys coriácea).

Mais de 200 mortes por ano no Litoral Norte

Os dados mais recentes do projeto de Monitoramento da Orla realizado pelo Ceclimar apontam que mais de 200 tartarugas-cabeçudas são encontradas mortas por ano no Litoral Norte do Rio Grande do Sul. O trabalho é realizado em um trecho de 130 quilômetros de praia entre Dunas Altas, em Palmares do Sul, e Torres.

Em 2017, foram 218 registros de cabeçudas mortas. “A maioria delas, a gente pode afirmar que é oriunda da interação com a pesca e com os espinhéis. A gente enxerga bem porque encontra animais mortos e com anzóis no esôfago” afirmou a bióloga Cariane Trigo. Ela salienta, no entanto, que este número deve ser ainda maior porque nem todos os casos resultam em encalhes na orla ou são computados pelo monitoramento.

A pesquisadora explicou que as tartarugas-cabeçudas são as mais capturadas acidentalmente em redes e, principalmente, por espinhéis em alto mar. “Caretta caretta é a espécie mais capturada em espinheis no mundo inteiro”, lamentou.

Em 2008, em sua dissertação de mestrado no Programa de Pós-graduação em Oceanografia Biológica da Universidade Federal do Rio Grande/FURG, a pesquisadora Danielle Silveira Monteiro, acompanhou 73 viagens de um navio de pesca com espinhel e constatou a captura de mais de 1,2 mil tartarugas.  O estudo estimou uma captura para cada mil anzóis.

Ilustração mostra como funciona a pesca de espinhel.

A pesca de espinhel, feita em alto mar, consiste em uma linha principal, onde são presas várias linhas acessórias, com anzóis e iscas, normalmente lulas e peixes, que atraem as tartarugas.  Alguns barcos usam espinhéis com mais de 16 mil anzóis.

“Por isso essa quantidade enorme que a gente vê tartarugas-cabeçudas mortas na beira da praia, principalmente nessa época da primavera e do verão. É a época que mais tem pesca e que mais elas vêm pra cá para se alimentar. Então, elas acabam engolindo esses anzóis. Algumas vezes nos barcos é possível tirar este anzol, mas na maioria não”, explicou a bióloga Cariane Trigo.

 

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