Homens e o mito da imortalidade: o que o Novembro Azul revela sobre o adoecimento masculino

Por Juliana Ramiro, psicanalista – colunista sobre saúde mental

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Imagem meramente ilustrativa. Foto: Engin Akyurt por Pixabay

Novembro chega e, com ele, o lembrete azul: é tempo de falar sobre a saúde dos homens. As campanhas de prevenção ao câncer de próstata se multiplicam, mas o convite que elas carregam, o de cuidar de si, ainda encontra muita resistência. Segundo o Ministério da Saúde, os homens vivem, em média, sete anos a menos do que as mulheres no Brasil. A maioria só procura atendimento médico quando os sintomas já são graves. O dado é alarmante, mas não surpreendente: o homem, ainda hoje, se coloca em risco como se fosse imortal.

Vivemos em uma sociedade que educa os meninos para acreditar na potência sem limites, na força que tudo resolve, no corpo que não adoece. Crescem aprendendo que sentir medo, dor ou fragilidade é fraqueza. É a herança de um ideal masculino que confunde coragem com autodestruição. É esse mesmo ideal que empurra o homem para a direção perigosa de um carro, para a briga na rua, para o abuso de álcool e para a negação do próprio corpo.

Na clínica, é comum encontrar mulheres em processo terapêutico há anos, enquanto seus parceiros sequer cogitam a possibilidade de um espaço de escuta. Quando vêm, muitas vezes, é porque “a mulher obrigou”. Poucos chegam porque desejam compreender suas angústias. E o que isso revela? Que o falso self masculino, esse “eu imbatível” construído para sobreviver a uma cultura que exige virilidade, cobra um preço alto. E esse preço, não raro, é o próprio adoecimento.

O corpo que adoece, seja pelo câncer, pela hipertensão, pela depressão, é também o corpo que não pôde falar. O que não se elabora na palavra se inscreve no corpo. E os homens, em grande parte, continuam sem espaço simbólico para nomear suas dores. O câncer, nesse sentido, também pode ser lido como uma doença de quem não conseguiu elaborar a própria existência.

Precisamos, portanto, ressignificar o que é ser homem. Cuidar de si não é fraqueza. Fazer terapia não é falta de coragem. Ir ao médico, chorar, pedir ajuda — nada disso tira o valor de ninguém. Pelo contrário, é no reconhecimento dos limites que mora a verdadeira potência.

O Novembro Azul é mais do que uma campanha de prevenção: é um chamado à vida.

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  • Juliana Ramiro é psicanalista, doutora em Letras, e uma apaixonada por música e literatura. E-mail: admin@julianaramiro.com.br

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