Função materna e função paterna: quem faz o quê?

Por Juliana Ramiro, psicanalista

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Imagem meramente ilustrativa. Foto: s05prodpresidente / Pixabay

Após a publicação do texto da última semana, recebi algumas perguntas de mães e pais curiosos sobre um tema que costuma gerar confusão: afinal, quem faz o quê na relação com o filho? É do pai a tarefa de impor limites e da mãe o cuidado?

Essa divisão parece ter feito sentido em outras épocas, mas muito mais por força de uma sociedade machista e patriarcal do que por uma necessidade real do desenvolvimento de uma criança. Na psicanálise, quando falamos em função materna e função paterna, falamos de função, não de gênero. É algo que se exerce, se faz presente — não algo que dependa de quem faz biologicamente.

Uma mãe solo, por exemplo, exerce tanto a função materna quanto a paterna para o filho. E isso é suficiente? É — desde que essas funções aconteçam de fato. Mas o que cada uma representa?

A função materna é aquela de cuidado, afeto, acolhimento e suporte emocional. É o continente que protege o psiquismo em formação, ampara e sustenta a existência da criança até que ela consiga, aos poucos, se organizar internamente para existir por si mesma. Um pai pode fazer isso? Sem dúvida. E muitos fazem, junto com a mãe ou sozinhos.

Já a função paterna é associada aos limites, aos cortes necessários para que a criança perceba que não é o centro absoluto do mundo, que existem outros, e que viver em sociedade exige respeitar espaços. É também uma função de segurança e de incentivo para que a criança queira ser, crescer, explorar. E essa função pode ser exercida por uma mãe, uma avó, um dindo — por quem estiver ali, presente, de forma viva e significativa para a criança.

Um ponto fundamental: não é quem cuida que decide que função está desempenhando. É a criança que percebe — é a forma como ela sente aquele cuidado que vai dizer o que é materno e o que é paterno. Por isso, na clínica, entender a quem a criança atribui essas funções é um dos primeiros passos para compreender como ela está se organizando emocionalmente no meio em que vive.

Não precisamos engessar: o mais saudável é que os cuidadores possam transitar entre as funções, assumindo, cada um, o que for preciso em cada momento. O que faz diferença, de fato, não é quem faz, mas que as funções existam e estejam disponíveis, não só física, mas psiquicamente.

Infelizmente, não é raro encontrar famílias “completas” em que um pai ou uma mãe estão presentes só no corpo — mas ausentes na alma, distantes emocionalmente, incapazes de sustentar qualquer uma das funções. Nesse caso, há ausência, mesmo que não falte ninguém na foto.

Lembro sempre: o bebê humano só se torna humano de verdade na relação com o outro, nos vínculos e nos modelos que experimenta nos primeiros anos de vida. É essa presença — real, viva e psíquica — que garante tudo o que somos ou podemos ser no presente e no futuro.

Nesta semana, te convido a rever o episódio do Psi Por Aí em que converso com a psicanalista e arteterapeuta Sabrina Sironi sobre a importância do cuidado na constituição do sujeito. Vale a pena conferir!


Ouça no Spotify.

  • Juliana Ramiro é psicanalista, doutora em Letras, e uma apaixonada por música e literatura. E-mail: admin@julianaramiro.com.br

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