Em uma coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira (06), a Polícia Civil (PC) e o Instituto-Geral de Perícias (IGP) apresentaram os avanços na investigação do caso do bolo envenenado que resultou na morte de três pessoas em Torres, no Litoral Norte gaúcho. A reportagem do portal de notícias Litoral na Rede esteve no local e acompanhou a entrevista coletiva.
À frente das investigações, o delegado Marcos Vinícius Veloso revelou que os exames preliminares apontaram envenenamento como causa das mortes. Entre as provas destacadas, estão análises realizadas pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) que encontraram a substância arsênio, um poderoso veneno, no alimento ingerido pela família.
De acordo com Marguet Inês Hoffmann Mittmann, diretora-geral do IGP, foram detectadas concentrações altíssimas de arsênio nas vítimas.
“Das provas periciais temos: concentrações altíssimas de arsênio nas amostras de sangue, urina e estômago”, declarou. Em uma das vítimas, a quantidade encontrada era entre 80 e 350 vezes o limite tolerável.
A contaminação foi rastreada até uma amostra de farinha usada no preparo do bolo e apreendida na casa da mulher que preparou o bolo, em Arroio do Sal. Segundo Mittmann, a concentração do veneno na farinha atingiu 65 gramas por quilo, um nível cerca de 2,7 mil vezes superior ao encontrado no bolo.
“Encontramos níveis elevados de arsênio em todas as vítimas. Esses níveis indicam a causa da morte por envenenamento, isso é inquestionável. Da mesma forma, foram encontrados níveis elevadíssimos de arsênio no bolo, uma concentração tão elevada que é impossível considerar uma contaminação acidental”, diz Mittmann.
Dois celulares foram apreendidos e estão sendo analisados. A polícia busca por provas oficiais que possam indicar alguma pesquisa relacionada ao veneno e suas consequências, assim como a compra da substância.
Divergências familiares como pano de fundo
O delegado Veloso mencionou que o caso envolve “divergências na família causadas por uma única pessoa”. Embora não tenha confirmado oficialmente, a principal suspeita é que a nora de Zeli, cujo nome não foi divulgado, tenha colocado o veneno na farinha intencionalmente. Ela foi presa nesse domingo (05).
A motivação do crime, segundo as investigações, seria um conflito entre a suspeita e uma das vítimas, iniciado há cerca de 20 anos.
“Essas divergências não eram relevantes para uma consequência tão drástica”, ponderou a delegada de Polícia Regional Sabrina Deffente. Ela também indicou que diligências realizadas reforçam que o envenenamento foi planejado por um membro da família.
Morte anterior sob suspeita
Outro elemento que chamou a atenção da investigação foi a morte do marido de Zeli, ocorrida três meses antes do incidente com o bolo. A delegada Deffente confirmou que foi solicitada a exumação do corpo para verificar possível conexão entre as mortes.
“Com a exumação, acredito que teremos outras respostas no inquérito e saberemos se há conexão entre as mortes”, afirmou. O procedimento, segundo a PC e o IGP, já foi autorizado pela Justiça e deve ocorrer nos próximos dias, possivelmente ainda nesta semana.
Autoria e outros desdobramentos
A Polícia Civil considera que os “fortíssimos indícios” apontam para a responsabilidade da mulher presa. Sandro Caron, secretário de Segurança Pública do RS, esclareceu que a prisão é temporária e visa avançar nas investigações. As autoridades também investigam a origem do arsênio utilizado no crime.
“Estamos investigando também a venda do arsênio. É uma venda ilegal”, explicou o delegado Veloso.
Homicídio qualificado
O caso foi enquadrado como homicídio duplamente qualificado, com as qualificadoras de motivo fútil e emprego de veneno. Contudo, há possibilidade de evoluir para triplamente qualificado, com a inclusão da qualificadora de dissimulação.
“É absolutamente desproporcional o motivo de ter cometido um crime dessa natureza”, declarou Veloso.
Nota da defesa
Em nota divulgada pouco antes do início da coletiva, a defesa de Deise Moura dos Anjos afirma que conversou com a suspeita, mas que ainda não teve acesso ao processo que resultou na prisão da cliente. Leia a nota:
“Deise Moura dos Anjos, presa temporariamente por suposto envenenamento no caso do bolo, na cidade litorânea de Torres/RS, vem a público manifestar que possui defesa constituída, representada pelos advogados Manuela Almeida, Vinícius Boniatti e Gabriela S. Souza. Até o presente momento, 06 de Janeiro, às 07hrs, a defesa prestou atendimento em parlatório à cliente, contudo, não teve acesso integral a investigação em andamento, razão pela qual se manifestará em momento oportuno”.
Relembre o caso
No dia 23 de dezembro de 2024, um grupo de pessoas da mesma família deu entrada no hospital de Torres após ingerirem um bolo preparado para uma confraternização. Segundo informações da Polícia Civil, exames determinaram que o doce continha arsênio.
As vítimas fatais foram Neuza Denize Silva dos Anjos, 65 anos, e Maida Berenice Flores da Silva, 59 anos, ambas irmãs de Zeli, além de Tatiana Denize Silva dos Anjos, 47 anos, filha de Neuza.
As três manifestaram sintomas graves, como vômitos e diarreia intensa, poucas horas após ingerirem a sobremesa. Zeli dos Anjos, que também consumiu o bolo, segue internada na UTI em estado estável.
Outro envolvido no caso, um menino que é neto de Neuza e filho de Tatiana, precisou ser hospitalizado, mas recebeu alta no fim desta semana e está em casa.