A dor é psíquica ou somática?

Por Juliana Ramiro, psicanalista

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Dor de cabeça, um estômago que não para de queimar, sintomas que parecem falar. Será que a dor que sentimos é algo puramente físico, uma questão do corpo, ou seria ela fruto da mente? Essa é uma das grandes questões que envolvem o entendimento da dor e do sofrimento humano. Para começar, vale diferenciar os termos: quando falamos de algo psíquico, nos referimos ao campo da mente, dos pensamentos e emoções. Já o somático diz respeito ao corpo físico, à carne, ao que é palpável.

Entre esses dois mundos, há uma área de estudos chamada psicossomática, que se dedica justamente às doenças que parecem habitar essa fronteira. Trata-se de um campo que reconhece que muitas vezes não é possível separar o que pertence ao corpo do que é da mente. Afinal, não somos apenas corpo nem apenas mente, mas uma complexa união entre os dois. Na prática, essa separação é mais teórica do que real.

Para a psicanálise, o que não é elaborado no campo psíquico, o que não encontra palavras ou pensamentos, tende a se manifestar no corpo. Como disse Nietzsche: “Tudo o que não fazemos para fora, fazemos para dentro.” E esse “fazer para dentro” pode se transformar em dores e adoecimentos. Uma discussão não resolvida que se converte em uma dor de cabeça incapacitante. Palavras que ficaram presas na garganta, transformando-se em náusea, gastrite ou vômito. A mente, incapaz de lidar com o peso de algo, lança o fardo sobre o corpo.

No consultório, esses sintomas falam o tempo todo. Relatos de dores físicas frequentemente estão ligados a experiências emocionais intensas e não elaboradas. Em casos mais extremos, algumas pesquisas apontam a relação entre câncer e traumas psíquicos profundos. É como se o corpo, ao atacar a si mesmo, criasse uma dor nova para dar conta de uma dor anterior.

Um fenômeno que se destaca hoje é o cutting, o ato de sujeitos (mais comumente adolescentes) — muitas vezes vítimas de abuso ou grandes traumas — se cortarem para aliviar uma dor emocional. Os cortes servem como um grito silencioso, uma tentativa de transformar a dor psíquica em algo mais “controlável”, ou como uma forma de autopunição. Essas ações revelam o quanto corpo e mente estão entrelaçados. Não existe um sem o outro, e um não adoece sem carregar o outro consigo.

Para a psicanálise, o sujeito que chega ao consultório está adoecido em corpo e alma. O trabalho terapêutico é um processo que, ao promover a cura de um, naturalmente alcança o outro. Quando se coloca em palavras aquilo que antes parecia impossível de dizer, o corpo se alivia. Quando o corpo deixa de carregar sintomas tão pesados, a mente se apazigua. Essa dança entre psíquico e somático é, na verdade, a própria essência do ser humano.

E você, já parou para ouvir o que o seu corpo tem a dizer? Fica o convite para refletirmos mais sobre esse tema no próximo episódio do nosso podcast, onde recebo o fisioterapeuta e especialista no método Rolfing, Rafael Ramiro. Vamos explorar juntos essa conexão profunda entre corpo e mente e pensar sobre as dores que carregamos — e as que podemos aliviar.


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  • Juliana Ramiro é psicanalista, doutora em Letras, e uma apaixonada por música e literatura. E-mail: admin@julianaramiro.com.br

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